Edital MCT/CNPQ 14/2008 Universal Processo 470333/2008-1



30 de maio de 2011

Fifa e CBF lucram, e Brasil terá prejuízo

JAMIL CHADE - O Estado de S.Paulo
ZURIQUE - A Copa do Mundo de 2014 ameaça deixar um outro legado ao Brasil: dívidas. Pessoas familiarizadas com a dimensão financeira do Mundial admitiram ao Estado que estão surpresas com a explosão nos custos de obras para estádios e outros itens da preparação e alertam que algumas arenas levarão até 2030 para quitar suas dívidas.
Arnd Wiegmann/Reuters
Arnd Wiegmann/Reuters
É a lei. Petrus Damaseb, do Comitê de Ética, lê o código interno da Fifa na audiência disciplinar
Fontes em Zurique calculam que sediar a Copa custaria ao País mais de R$ 23 bilhões, incluindo obras nos aeroportos e de mobilidade urbana. "As contas não fecham", alerta um cartola envolvido na parte financeira da preparação para o evento.
O iminente prejuízo do Mundial é uma conta que as esferas de governo (federal, estadual e municipal) irão bancar sozinhas: nem Fifa nem CBF terão os lucros ameaçados no torneio.
Neste momento, a entidade internacional está bastante preocupada com os gastos dos estádios e os custos de operação total. A última estimativa feita na Suíça é de que o Brasil gastará pelo menos R$ 6,3 bilhões para erguer os palcos do torneio.
Em 2007, quando da escolha do Brasil para organizar o Mundial, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, garantiu que não haveria aporte de recursos públicos para a realização do evento. Três anos depois, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Social) criou uma linha de crédito, inédita na instituição, para financiar a construção de arenas.
Lotação. Não há dúvidas, segundo a fonte consultada pelo Estado, que o Brasil terá facilidade em lotar os estádios durante o Mundial e se beneficiará da expansão de infraestrutura.
A taxa de ocupação dos estádios e o tamanho dos acordos de empréstimos com o BNDES, porém, exigirão anos para que o dinheiro investido pelo governo brasileiro seja recuperado e, ainda assim, não haverá garantias de que isso ocorrerá.
Para estádios calculados em R$ 500 milhões, a estimativa é de que poderão recuperar pouco mais da metade do dinheiro durante a Copa. Mas, nos anos seguintes, sofreriam para quitar o resto da dívida.
A previsão é de que poderão acumular lucros de R$ 9 milhões por ano se forem usados de forma plena. Na prática, levariam 20 anos para pagar suas dívidas.
A entrada de turistas, a exposição do Brasil no mundo e investimentos poderiam compensar. Mas as contas da África do Sul são usadas como alerta que prever esses ganhos é tão incerto quando o vencedor do Mundial.
A Copa de 2010 gerou uma renda para a economia sul-africana de US$ 4,9 bilhões (R$ 7,9 bilhões), praticamente o mesmo valor que foi gasto na construção de estádios e infraestrutura pelo governo federal.
O problema é que essa conta de gastos não inclui o que províncias e cidades tiveram de injetar para ganhar o direito de ser sede. No final das contas, o buraco chegou a quase US$ 1 bilhão (R$ 1,59 bilhão).
No caso do Brasil, os gastos com a Copa do Mundo seriam já duas vezes superiores ao que o país africano colocou para o evento de 2010.
Garantida. Apesar da constatação do prejuízo, a Fifa já tem sua arrecadação garantida. A venda de direitos de TV, publicidade e produtos comerciais renderá ao órgão um total de US$ 3,8 bilhões (R$ 6 bilhões). Só os direitos de transmissão respondem por US$ 2,2 bilhões (3,5 bilhões) - com US$ 1,6 bilhão (R$ 2,5 bilhões), o marketing completará o caixa.
Depois de usar o dinheiro para diversas competições e pagar US$ 1,3 bilhão (R$ 2 bilhões) em custos do Mundial, a entidade sairá do Brasil com US$ 200 milhões (R$ 318 milhões), isentos de impostos. Nenhum custo com infraestrutura ou estádios cairia nas mãos da organização - muito menos dívidas.
No que se refere aos lucros, a entidade já esfrega as mãos. A renda obtida será quase 100% superior ao que a Copa da Alemanha movimentou em 2006 e três vezes maior que na França-98.
As contas da CBF também não preveem perdas, já que a entidade não colocará um centavo sequer em estádios e nem em infraestrutura.
Na África do Sul, o Comitê Organizador Local teve um lucro de US$ 10 milhões (R$ 15,9 milhões), pequeno se comparado aos mais de US$ 80 milhões  (R$ 127 milhões) que a federação alemã conseguiu em 2006.
Pessoas envolvidas com as contas do evento usam dados do TCU (Tribunal de Contas da União) para mostrar como ainda haveria o peso "desproporcional" colocado sobre o governo.
Segundo um levantamento do TCU do final de 2010, 98,5% dos R$ 23 bilhões previstos para serem gastos nas obras da Copa de 2014 sairão dos cofres públicos.
O acordo entre o Brasil e a Fifa sobre a isenção de impostos ainda evitará que R$ 500 milhões sejam coletados pelo Tesouro. A isenção vai além da Copa e também valeria para 2015.
O orçamento recorde para a Copa de 2014 é US$ 300 milhões a mais do que na África do Sul. As 32 seleções receberão um pacote de US$ 454 milhões em prêmios, o maior da história.
Platini. Relaxado e caminhando nas ruas de Zurique neste domingo, o ex-jogador francês Michel Platini, hoje presidente da Uefa (União Europeia de Futebol), disse que fala de tudo, menos da preparação do Brasil para o Mundial. " Disso eu não falo. Só (Ricardo) Teixeira pode responder como vai o Brasil", comentou.
Questionado se os brasileiros estariam em melhor situação que Polônia e Ucrânia, que vão sediar a Eurocopa de 2012 e sofrem com atrasos em obras, Michel Platini apenas sorriu. "Hum, não sei".

22 de maio de 2011

Obras da Copa de 2014 desalojam 65 mil pessoas no País

Almir Leite - O Estado de S.Paulo
"Muitos vão sorrir, mas alguns vão chorar." O presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, recorre a esta frase sempre que fala sobre o impacto que a arena do clube terá para Itaquera. O riso virá das oportunidades que o estádio paulistano da Copa de 2014 proporcionará a quem vive na região. O choro fica por conta do "preço a pagar pelo desenvolvimento"". Nessa situação estão pelo menos 5.200 pessoas, ameaçadas de despejo para obras no entorno do estádio. É um risco que aflige outras 60 mil pessoas em várias sedes do Mundial, Em São Paulo, moradores de duas comunidades próximas da Arena do Corinthians, as favelas da Paz e da Fatec (também conhecida por Agreste de Itabaiana), estão apreensivas. Temem que o futuro seja ainda pior que o presente.
Na Favela da Paz, a menos 500 metros da futura arena, reclamam da falta de diálogo do poder público. "Estou aqui há 16 anos, já perdi dois barracos em incêndios e ninguém me ajudou a reconstruir"", diz Diana do Nascimento, mãe de 4 filhos e que os vizinhos garantem ser a mais antiga moradora do local. "Agora que vai ter Copa, chegam aqui e dizem que temos de sair. Falam que é por causa do córrego (Rio Verde), mas não para onde vamos.""
A Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente confirmou, em nota, que há várias obras previstas na segunda fase das obras do Parque Linear Rio Verde (que o governo admite fazer parte dos projetos da Copa) e que "a área está em fase de desapropriação, pois contava com moradias na área de preservação permanente"". A nota não esclarece se será oferecido algum tipo de benefício aos atuais moradores. A Secretaria Municipal de Habitação diz só realizar realocação de famílias nas áreas em que fará obras de urbanização. Na Favela da Paz, a execução dos projetos está prevista para o período entre 2013 e 2017.
Distante cerca de 3 km do Itaquerão, a Favela da Fatec (na avenida Águia de Haia, em frente ao terminal AE Carvalho), já teve 82 das cerca de 800 famílias removidas - as que ficam à beira do córrego. A retirada de outras 52 está sendo preparada. "A avenida pode servir de passagem para quem vai para o estádio. Acho que fica feio para quem vem do estrangeiro ver uma favela no caminho"", diz a doméstica Andrea Cristina Gonçalves. "Eles pagam R$ 4,3 mil para a família e ela tem se virar para arrumar lugar para morar. Esse dinheiro dá para quê? E não falam em dar um terreno para a gente, em colocar em apartamento da CDHU"", critica.
A CDHU explica que as famílias foram retiradas a pedido da Prefeitura porque estavam em área de risco e não por causa da Copa, mas diz que, além dos R$ 4,3 mil dados a elas, foi firmado compromisso de "futuro atendimento habitacional definitivo"". A Secretaria do Verde informa apenas que o Parque Linear Ponte Rasa está em fase de estudos.
Aflição comum. Sair do local onde moram e receber indenização baixa é drama que se repete em outras cidades, como Belo Horizonte. "Só dá para comprar casa na periferia, mas a gente trabalha perto do centro"", reclama a diarista Patrícia Venâncio, moradora do Recanto UFMG (70 famílias serão atingidas), que não sabe para onde irá com os pais e dois irmãos.
A prefeitura discorda. Alega pagar R$ 30 mil por família removida, mais indenização com base em benfeitorias, além de dar opção para escolha de mudança para apartamentos do programa habitacional Vila Viva.
Em Cuiabá, as desapropriações atingirão moradores e comerciantes, afetando cerca de 5 mil pessoas. Os lojistas temem receber "ninharia"" e não ter como tocar a vida. "Vamos definir os valores com laudos técnicos em mãos"", diz Djalma Mendes, secretário da Agecopa, que cuida de assuntos referentes ao Mundial. 
COLABORARAM MARCELO PORTELA E FÁTIMA LESSA